Batalha pela permanência
Disputa por tempo de conexão dos usuários e alongamento de jornadas online opõe aperfeiçoamento do algoritmo e preocupações com saúde mental
Otempo gasto pelas pessoas nas redes sociais atingiu um limite? Evidentemente, não há uma resposta única para essa questão. Existem grupos sociais e mercados em estágios distintos de conexão e uso — o Brasil, por exemplo, se mantém ávido, com suas mais de três horas diárias, em média, por usuário. Paralelamente, enquanto ferramentas como os algoritmos são aperfeiçoadas para atrair atenção constante, diversos movimentos alardeiam sobre os riscos da exposição em excesso, que tira a espontaneidade e instala uma dinâmica compulsiva, que pode levar à exaustão emocional.
As batalhas pelo engajamento, pelo consumo e pela saúde mental convivem há tempos, têm ondas de intensidade disformes, mas ganharam ainda mais relevância desde que as pessoas passaram a nascer com celulares nas mãos e o aparelho se tornou a principal tela de consumo de mídia e de e-commerce.
Entre diversos debates sobre o tema, o Financial Times publicou neste mês uma análise com base em estudo global da GWI, que investigou hábitos de 250 mil pessoas maiores de 16 anos em mais de 50 países. A empresa de pesquisa, que vem acompanhando a jornada de consumo das redes sociais, aponta que o tempo médio dedicado pelas pessoas atingiu seu pico em 2022 e, desde então, caiu 10%, até o ano passado, nos países desenvolvidos. Segundo o levantamento, a principal faixa etária responsável por essa queda é justamente a dos jovens, de 16 anos a 24 anos, que continuam sendo o público mais conectado, mas diminuíram o período de uso.
Especialistas ouvidos pela jornalista Amanda Schnaider para a reportagem das páginas 24 e 25 apontam a fadiga digital, a maior sobriedade em relação às plataformas e a demanda crescente por privacidade no ambiente virtual como alguns dos fatores que podem explicar a redução no tempo médio de dedicação às redes sociais. Um possível movimento global de reequilíbrio na economia da atenção impacta as estratégias de marketing e obriga marcas e plataformas a reorientar seus planos para manterem relevância e valor nesse ambiente.
Paralelamente, analistas de desempenho das principais plataformas globais de mídia apontam que o principal valor atual desse serviço não é mais o total de assinantes, mas sim o tempo dos usuários dedicado ao consumo. Permanecer conectado e voltar mais vezes é o que garante a receita publicitária.
A relevância do tempo online e da frequência de uso embasam movimentos como os de investimentos da Netflix em transmissões esportivas e em espaços físicos, como o parque temático Netflix House, em Dallas e Filadélfia, e o restaurante Netflix Bites, em Las Vegas. Reforçando a ideia de que a extensão de marca é uma aliada importante para reforçar a conexão do público — em especial a dos fãs —, o YouTube também segue esse movimento e dará nome a um teatro em São Paulo.
Já a Meta amplia o investimento em um aplicativo do Instagram dedicado à TV, como parte da estratégia para expandir sua presença em vídeo, conseguir sessões mais longas e disputar a atenção na telona com o YouTube. No Brasil, a Globo investe para se manter atrativa na TV, de olho nas novas possibilidades da DTV+, mas segue também na direção oposta, com a produção de mais de três mil vídeos verticais por mês nos apps e sites e, agora, no lançamento de novelas short form, os microdramas. Ninguém mais do que a Globo sabe o valor de recorrência do espectador. Não à toa, uma das novidades do YouTube para 2026 será a produção de novelas para o canal Noverama, também no estilo microdrama. Segundo o Relatório Global de Estatísticas Digitais, publicado pela GWI em julho, o consumo global de vídeos curtos é 14% maior do que o de TV tradicional.
As estratégias para prolongar o tempo de permanência das pessoas nas plataformas e o engajamento do público com as marcas precisam avançar considerando que o melhor dos mundos para todos os envolvidos é o de realizar conexões de qualidade.