Opinião

O Legal Design e a jornada de encantamento ao consumidor

Muitos dos discursos sobre experiência esbarram no momento da decisão de compra em textos longos e técnicos

Gisele Karassawa

Sócia-fundadora e CEO do VLK Advogados 3 de setembro de 2025 - 14h00

No universo do marketing e da comunicação, fala-se cada vez mais sobre a importância de criar experiências memoráveis para os consumidores. Sites visualmente impactantes, campanhas envolventes e estruturação de jornadas de compra fluidas são investimentos indispensáveis para encantar o público.

Mas há um ponto frequentemente negligenciado nessa jornada: o momento em que o cliente se depara com documentos jurídicos, como contratos, termos de uso ou políticas de privacidade.

Há um verdadeiro abismo que separa as narrativas estratégicas e sofisticadas do topo e meio do funil de marketing para que ao final, quando da decisão de compra, o consumidor se depare com textos longos, técnicos e incompreensíveis — um verdadeiro anticlímax no processo de encantamento. É exatamente aqui que o Legal Design entra como peça-chave para alinhar forma e conteúdo na relação entre marcas e pessoas.

O Legal Design é uma abordagem que une Direito, Design e Inovação para transformar documentos jurídicos em ferramentas acessíveis, compreensíveis e atraentes para o usuário final. Trata-se de aplicar uma lógica user centric, ou seja, colocar o consumidor no centro do processo de comunicação daquela informação jurídica.

Se o cliente precisa entender com clareza os termos que regem sua relação com a marca, essa informação não pode ser apresentada em blocos de textos com termos complexos e técnicos. Ao contrário, deve ser traduzida em linguagem clara, visualmente organizada e alinhada à experiência positiva construída nas demais interações com a empresa.

Sob a perspectiva de quem constrói marcas, o Legal Design representa mais do que um diferencial competitivo: ele reforça atributos como confiança, transparência e respeito.

Um contrato bem estruturado, que combina texto objetivo, fluxos visuais e até ícones explicativos, contribui para reduzir atrito, aumentar a percepção de credibilidade e criar conexões duradouras. Em tempos de consumidores cada vez mais atentos à coerência das marcas, documentos confusos ou mal elaborados podem ser tão prejudiciais quanto uma campanha mal executada.

Os princípios do Legal Design oferecem um guia valioso para quem deseja alinhar comunicação e experiência do consumidor: clareza ao usar linguagem simples e direta, acessibilidade ao organizar documentos de forma visual e fácil de navegar, empatia ao considerar as reais necessidades do usuário, experimentação com métodos de design thinking para testar formatos mais eficazes e, sobretudo, transparência, assegurando informações completas sem esconder termos importantes em letras miúdas ou em jargões técnicos.

Especificamente com relação à transparência, é importante destacar que se trata de requisito legal, e transborda questões puramente de marca e reputacionais. O Código de Defesa do Consumidor, por exemplo, prevê como premissa das relações de consumo a transparência e estabelece como direito básico do consumidor em seu artigo 6°, III, o acesso a informações adequadas e claras sobre os produtos e serviços.

No mesmo espírito, a Lei Geral de Proteção de Dados também estabelece como princípio norteador para o tratamento de dados pessoais a transparência, devendo ser garantido aos titulares informações claras, precisas e facilmente acessíveis sobre o que é feito com seus dados pessoais e por quem.

Quando aplicados, esses princípios contribuem para transformar a jornada legal do cliente em um prolongamento natural da experiência encantadora promovida pelo marketing. O impacto é direto: consumidores mais bem informados, relações mais duradouras e menor risco de questionamentos e conflitos jurídicos. Em última análise, o Legal Design não é apenas sobre documentos — é sobre fortalecer a narrativa da marca em todos os pontos de contato.

Legal Design Summit

Essa discussão estará no centro do Legal Design Summit, que acontece dias 11 e 12 de setembro, na Universidade de Helsinque, na Finlândia. O evento, considerado o mais importante do mundo na área, reunirá especialistas, designers, advogados e executivos para debater como tornar o direito mais humano, visual e conectado às demandas de um mercado em transformação.

Entre os temas em destaque estão o uso de inteligência artificial em documentos jurídicos, a ética na comunicação legal, e cases globais de empresas que já aplicam o Legal Design.

A programação do Legal Design Summit deste ano provoca fortes expectativas com relação a insights valiosos sobre como alinhar branding, experiência do usuário e confiança jurídica em uma mesma estratégia.

Em um cenário em que o consumidor exige clareza e autenticidade em todas as interações, o evento emerge como um elo essencial entre a promessa da marca e a realidade da sua entrega com segurança jurídica.