Precisamos voltar a humanizar a escolha de projetos
Entre triagens digitais e narrativas humanas, está o desafio de reconectar marcas e criadores
Quem trabalha com audiovisual sabe o quanto é desafiador chegar até as marcas patrocinadoras nos dias de hoje. As portas estão mais distantes e os processos, mais automatizados. Quando inscrevemos um projeto em uma dessas plataformas de fomento ou seleção, o retorno quase sempre é o mesmo:
“Sua inscrição no edital XX – Banco de Projetos foi realizada com sucesso! Uma vez inscrita, sua proposta não pode mais ser alterada.” E, com isso, o diálogo se encerra antes mesmo de começar.
Compreendo perfeitamente a sobrecarga das áreas de marketing e sustentabilidade. O volume de propostas é imenso, e é natural que a tecnologia — e até mesmo a inteligência artificial — tenha sido incorporada para organizar fluxos, aliviar o trabalho das equipes e agilizar triagens. Faz sentido. Mas há um risco silencioso nesse processo: quando tudo se torna automatizado, perde-se o essencial: o olhar, a escuta e a compreensão humana do propósito de um projeto.
Nenhum formulário é capaz de traduzir as nuances criativas, o impacto simbólico e a intencionalidade de um conteúdo pensado para dialogar com determinada audiência. Projetos audiovisuais não são produtos padronizados; são narrativas que pedem conexão, empatia e visão compartilhada. E isso só é percebido na conversa, na troca, no olho no olho.
Os processos de pitching continuam sendo a forma mais justa e assertiva de avaliar o potencial de um projeto. É nesse momento de encontro que se entende se há afinidade de valores, se a narrativa está alinhada à identidade da marca e se o investimento pode gerar um retorno de valor real — não apenas financeiro, mas também emocional, cultural e social.
Por isso, talvez o caminho não seja abandonar as plataformas, mas repensar seu papel. Que elas funcionem como triagem inicial, filtrando o que for necessário, mas que a decisão final volte a incluir o fator humano, com uma etapa de diálogo entre quem cria e quem decide. Essa conversa é o que permite enxergar o que nenhum algoritmo consegue: a verdade por trás das ideias.
A tecnologia pode ajudar a organizar o processo. Mas é o encontro que revela o propósito. E, se queremos que as marcas sejam mais autênticas, sustentáveis e emocionalmente relevantes, está na hora de reaproximar pessoas, projetos e propósitos, começando, simplesmente, por uma boa conversa.