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Opinião

Tempo, confiança e consistência

A qualidade das agências atuantes no Brasil – um dos melhores do mundo em criatividade e capacidade de atendimento profissional e eficiente – se em parte explica também joga contra as relações duradouras


30 de maio de 2018 - 17h25

Momentos de conquistas são dos mais felizes tanto nas relações pessoais como nas profissionais. Para as agências, a chegada de um novo cliente costuma ser muito comemorada – até porque geralmente acontece após estafantes processos de concorrências. Entretanto, na maioria das vezes, o principal desafio é manter a parceria, com bom nível de confiança e evolução produtiva para as duas partes. Embora não seja fácil, há os que conseguem por muitos anos.

Uma das reportagens especiais da edição Agências & Anunciantes 2018 publica um ranking com mais de 200 relações que já ultrapassaram dez anos – o que resulta, provavelmente, no mais amplo levantamento do gênero já feito no mercado brasileiro.

Uma leitura atenta dos casamentos nacionais e regionais mais duradouros permite, entre outras conclusões, apontar como principais fatores da longevidade os acordos de alinhamentos globais, que muitas vezes independem das vontades e humores dos executivos atuantes no País, e, na ponta oposta, a crença de clientes nacionais de que é melhor aparar arestas do que começar um novo casamento com outra que não conhece tão bem sua história e seus propósitos.

Outra constatação óbvia é a de que a afinidade entre as partes é combustível para estratégias de comunicação mais consistentes. Todavia, a qualidade das agências atuantes no Brasil – um dos melhores do mundo em criatividade e capacidade de atendimento profissional e eficiente – se em parte explica também joga contra as relações duradouras, na medida em que os anunciantes têm ótimas opções fora da lista de parceiras atuais, muitas delas ávidas por fazer negócio – algumas até dispostas a fazer qualquer negócio. Esse movimento, de certa forma, acabou empurrando o mercado de agências para uma uniformidade que gera percepção de comoditização – risco agravado pelo fato delas não se dedicarem tanto à diferenciação de suas imagens em relação às concorrentes.

A briga por novos negócios fragilizou as agências nas últimas décadas, enquanto o poder de decisão de ambos os lados foi em boa medida transferido para fora dos limites territoriais brasileiros. Quando o dono da agência tratava com o dono da marca, a chance da relação perdurar era maior e os acordos eram mais afiançados por aspectos pessoais. Atualmente, embora a química entre os profissionais envolvidos continue sendo um fator relevante, o cenário é muito mais técnico, pragmático e efêmero, tanto para as relações comerciais entre empresas como para as carreiras dos executivos de publicidade e marketing – e seus turnovers acelerados. Além disso, aumentaram as parcerias firmadas com visão financista e, à reboque, as concorrências especulativas, que geram desgastes não só para as equipes das agências como também para os próprios anunciantes – há casos em que os contratos anteriores são renovados, mas, via de regra, à custa de deterioração no entusiasmo da agência e, em contrapartida, remuneração menor pelo cliente.

Embora bodas longas costumem – com razão – ser festejadas, é preciso considerar que ser duradoura não é sinônimo de relação boa. Para muitos, mais importante do que ser extensa, é a parceria ser frutífera – “melhor viver dez anos a mil do que mil anos a dez”, defendeu Lobão em sua Décadence Avec Élégance; e, mais elegante, declamou Vinícius de Morais em seu Soneto de Fidelidade: “que seja infinito enquanto dure”.

 

*Crédito da imagem no topo: kmlmtz66/iStock

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