Maternidade, carreira e culpa: o julgamento que muitas mulheres enfrentam 

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Maternidade, carreira e culpa: o julgamento que muitas mulheres enfrentam 

Debate trazido pela campanha do Dia das Mães de O Boticário expõe as dificuldades e a pressão da sociedade sobre mulheres inseridas no mercado de trabalho. Conheça as histórias de lideranças que aprenderam a conciliar os dois mundos e a não exigir tanto de si mesmas na criação dos filhos  


5 de maio de 2022 - 8h14

O tema central da campanha do Dia das Mães de O Boticário deste ano é a culpa materna. No filme #MaternidadeSemJulgamentos, criado pela agência AlmapBBDO e veiculado na TV e nas redes sociais da marca, uma mãe é colocada como ré em frente a um júri no tribunal sob acusação de não conseguir amamentar o filho, de deixá-lo chupar chupeta, de não criar uma rotina, de permitir a ele comer doces e ficar na frente das telas. 

A campanha, que contou também com outras ações como ativação de conteúdo com mães influenciadoras e consumidoras, gerou um grande debate: de um lado, mulheres que se identificaram e se emocionaram com o final do vídeo. Do outro, a crítica de que o constante julgamento sentido pelas mães foi reiterado no filme.  

Para Renata Gomide, Diretora de Marketing do Grupo Boticário, a campanha é um retrato da sociedade brasileira e foi criada para que alguma transformação aconteça. “Pela nossa capilaridade, sempre tivemos a preocupação de trazer temas que reflitam o que as pessoas estão discutindo. Esse ano, identificamos o julgamento como a principal dor das mães e decidimos falar sobre o assunto de maneira clara, como um problema a ser debatido e resolvido. Nosso papel foi mostrar como as frases ditas para as mães as pressionam ainda mais, e como cada uma pode viver seu modelo de maternidade com plenitude”. 

 

Renata Gomide é Diretora de Marketing do Grupo Boticário (Crédito: Tulio Vidal)

Segundo uma pesquisa da Ipsos realizada no início de 2021 com mães e pais de 28 países, incluindo o Brasil, 46% das brasileiras se sentem julgadas com frequência como mães, contra 36% dos pais que apresentam o mesmo sentimento sobre a paternidade. A porcentagem posiciona as mães do Brasil entre as que mais se sentem frequentemente julgadas no mundo. Na média global, o percentual é de 38%. 

“É mais comum que as mulheres tenham essa carga de culpa porque existe uma pressão social muito maior na maternidade em comparação com a paternidade. Com a campanha, queremos também acender a empatia entre as mães para que aliviem esse sentimento, ao invés de aumentá-lo com seus próprios julgamentos e autojulgamentos. Usamos para isso o principal julgamento de todos: o dos seus filhos, o que mais importa”, comenta Rita Almeida, head de estratégia para O Boticário na agência AlmapBBDO. 

 

Rita Almeida é head de estratégia para O Boticário na agência AlmapBBDO (Crédito: Divulgação)

Independentemente das opiniões sobre a campanha, uma coisa é certa entre diferentes perfis de mulheres: a experiência da maternidade é um dos momentos mais importantes da jornada individual, mas é mesmo uma condição inevitável de culpa e julgamento, sobretudo quando a escolha da mulher é conciliar maternidade e carreira. 

“Muitas vezes achamos que precisamos dar conta de tudo sozinhas, mas é impossível. Temos que ter esta consciência antes que seja tarde e que nossa saúde física e mental fique comprometida. Não foi fácil pra mim, já me culpei e me cobrei muito, mas sempre é tempo de buscar o melhor equilíbrio e se cuidar, cuidar bem da família e do trabalho”, diz Stella Brant, sócia e Advisor da Liv Up, startup de alimentação saudável, e mãe do Theo, 12, e da Nina, 9. 

 

Stella Brant é sócia e Advisor da Liv Up (Crédito: Divulgação)

Ex-diretora de marketing da 99, empresa em que começou sua atuação no mundo das startups, por duas décadas Stella traçou uma carreira na área de marketing e inovação da Ambev, onde foi uma das primeiras mulheres a tirar 6 meses de licença-maternidade. “Tive conversas abertas com meu gestor sobre estar fora por tanto tempo e combinamos bem sobre a volta, o que me deu tranquilidade para me dedicar integralmente aos meus filhos, sabendo que a empresa me valorizava e se preocupava comigo. Mas esta não é a realidade de muitas mulheres”, completa. 

Stella sempre quis ser mãe e conseguiu engravidar quando decidiu que era o momento, mas enfrentou algumas dificuldades no caminho. “Perder a primeira gestação me trouxe insegurança, medo e mostrou que não bastava querer. Tive muito apoio e acolhimento da Ambev e, depois dessa, as outras duas foram muito tranquilas. Para equilibrar carreira e maternidade, é essencial ter uma rede de apoio dentro e fora da empresa, para conseguir dar o melhor de si como profissional, mãe e mulher, mas sabendo que em cada momento um deles precisará de mais foco e outras pessoas te cobrirão nos demais”, conta. 

Rede de apoio nem sempre é uma realidade entre as brasileiras. De acordo com estudo feito em 2021 pela Catho, entre as mães que trabalham fora, 69% deixam seus filhos com outras pessoas, 19% com os pais e 12% em uma escola ou creche. Já entre os pais que trabalham fora, 58% deixam os filhos com as mães, 36% com outras pessoas e 6% em uma escola ou creche. Com a pandemia, a pesquisa também mostra que a sobrecarga ficou com elas: 92% das mulheres que estavam em home office também eram as responsáveis pelos filhos, que ficaram em casa no período. 

Diferentemente de Stella, Tatiana Lemos, que tem passagem por grandes empresas como Unilever e Nestlé e hoje é CMO da Oritain, na Suiça, é mãe solo e se deparou com a maternidade repentinamente, aos 23 anos. “A força do vínculo que criei com o Davi desde a barriga guiou minhas decisões. Assim como eu tive a certeza de que não conseguiria viver sem ele, estava certa de que não poderia sacrificar o que havia me definido até ali, que eu também amava, pela maternidade. Eu sabia que se tivesse que abrir mão da minha carreira naquele começo tão promissor, iria passar a conta pra ele um dia.” 

 

Tatiana Lemos é CMO da Oritain (Crédito: Divulgação)

Para Tatiana, o julgamento das pessoas por ela ser mãe e uma profissional de sucesso foi constante em sua vida. “Além da carreira bem-sucedida, eu era jovem e solteira. Nas reuniões da escola, aparecia sozinha ao lado dos casais e sentia o julgamento. Certa vez uma chefe, em uma avaliação, me perguntou se poderia levar minha situação de mãe solo para negociar meu salário com superiores, pois seria um tiro certeiro. Foi um soco no estômago porque eu era merecedora pelo trabalho”. 

Adriana Barbosa, CEO da plataforma Pretahub, Presidente do Instituto Feira Preta e mãe da Clara, de 8 anos, conta sobre como o sentimento de culpa pode acompanhar uma mãe desde o início da maternidade. “Sempre me senti culpada, até ficar em um nível insuportável e gerar desequilíbrio emocional. Tive depressão pós-parto, e parte disso vinha da culpa. Tive que procurar ajuda profissional, para desenvolver a musculatura emocional. Faço terapia há alguns anos.” 

 

Adriana Barbosa é CEO da plataforma Pretahub e Presidente do Instituto Feira Preta (Crédito: Arthur Nobre)


Para Adriana, desconstruir a imagem de uma mãe perfeita é essencial para equilibrar carreira, a vida de empreendedora e a maternidade. “Estou construindo a ideia de uma mãe mais humanizada, passível de erros e imperfeições. Fui educada olhando para minha mãe como uma super-heroína, mas quando passei a ser mãe e ter consciência das minhas subjetividades, comecei a olhar para ela com mais generosidade, menos cobranças, e também a administrar melhor as minhas sensações de culpa ao conciliar a maternidade com os meus negócios”.
 

Até o momento, a #MaternidadeSemJulgamentos já alcançou quase 80 milhões de mulheres. Seja nas campanhas de publicidade, nas redes sociais ou nas cadeiras de executivas ocupadas por mulheres, os julgamentos enfrentados por uma mãe, que existem há séculos, nunca foram tão discutidos. No lugar de romantizar a maternidade, reflexões como as propostas pela campanha de O Boticário refletem uma realidade que precisa ser trazida à luz.  

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