Opinião

A Grande Ideia ainda existe?

A audiência que antes estava concentrada em poucos meios agora é volátil e fragmentada

Marcelo Bernardes

CEO da agência Purpple 5 de novembro de 2025 - 6h00

Do filme de 30 segundos ao TikTok de seis segundos: como manter relevância criativa em um ecossistema de mídia cada vez mais pulverizado?

Durante décadas, a propaganda viveu em busca da Grande Ideia. Cunhado por David Ogilvy nos anos 1950, o conceito da Big Idea era criar uma ideia central — simples e poderosa — capaz de transformar campanhas em slogans eternos, jingles cantados nas ruas e peças que entravam para a cultura popular.

Em um cenário de concentração de audiência, a fórmula parecia imbatível. Um único conceito se desdobrava pela TV, pelo rádio e pelas revistas, criando consistência e impacto. Mas o mundo mudou. Hoje, diante de feeds infinitos, múltiplos formatos e segundos preciosos para capturar a atenção, fica a dúvida: ainda temos grandes ideias?

“Só Dove tem um quarto de creme hidratante”, “Skol: a cerveja que desce redondo” e “Pipoca e guaraná”. Conceitos que moldaram décadas de propaganda. Bastava um jingle bem executado para virar parte da rotina das pessoas e entrar na cultura.

Hoje, o desafio é outro. Vivemos sob múltiplos estímulos: TikTok em dez segundos, reels, TV competindo com segundas telas, OOH digital em movimento. Saímos da eficiência do impacto massivo de um conceito para uma construção em que a soma de todos os contatos forma a Grande Ideia. A audiência que antes estava concentrada em poucos meios agora é volátil e fragmentada.

A Grande Ideia não desapareceu — ela mudou de papel. Foi de um conceito único com impacto massivo para se tornar uma plataforma criativa, elástica. Uma narrativa adaptável, capaz de transitar do filme de 30 segundos ao meme.

Exemplos não faltam. Seja em “A volta do McFish”, da Galeria, que virou conversa, ou em “Gerações”, da Almap, que nasceu como peça institucional e se multiplicou no WhatsApp.

Nesse cenário, nós, agências, além de sermos desafiadas a criar ideias geniais, somos também guardiãs da coerência da ideia. Sustentar uma plataforma criativa em meio a centenas de entregas é bastante desafiador.

Fragmentação não é desculpa para dispersão. Pelo contrário: é quando há excesso de mensagens que as marcas mais precisam de um conceito central forte para serem lembradas.

A Grande Ideia não morreu. O que morreu foi a ideia de que ela se sustenta sozinha. Hoje, ela é mais necessária do que nunca — como potência criativa em meio à fragmentação. Em um mundo de estímulos infinitos, só as marcas com esse poder conseguem ser lembradas.