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IA na indústria da animação: uma reflexão sobre criatividade e tecnologia

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Opinião

IA na indústria da animação: uma reflexão sobre criatividade e tecnologia

O medo da adoção de novas tecnologias é antigo, mas a inteligência artificial chegou com tudo, e para ficar, tanto como ferramenta de trabalho, como parte do nosso cotidiano


24 de abril de 2025 - 6h00

A trend do Studio Ghibli, que viralizou recentemente, reacendeu um debate que há muito tempo circula entre os bastidores da indústria criativa: como a inteligência artificial (IA) vem sendo encarada pelos profissionais de animação? Enquanto uma parte tenta se fechar para as novas tecnologias, utilizando-as o mínimo possível, outra tenta usar toda a sua capacidade para produzir trabalhos mais rapidamente. A discussão, no entanto, não está apenas na indústria, mas no meio acadêmico, que tenta entender e prever a utilização das novas tecnologias de IA, assim como a melhor maneira de apresentá-las aos alunos, futuros profissionais.

Primeiramente, é preciso lembrar que o medo da adoção de novas tecnologias na indústria criativa não é algo recente. No livro Computer Animation: A Whole New World, o presidente dos estúdios Pixar e da Walt Disney Animation, Edwin Catmull, comentou sobre o curta Luxo Jr (1986): “Naquela época, a maioria dos artistas tradicionais tinha medo do computador. Eles não percebiam que o computador era apenas uma ferramenta diferente no kit do artista, mas, em vez disso, o percebiam como um tipo de automação que poderia colocar em risco seus empregos. Felizmente, essa atitude mudou drasticamente no início dos anos 80 com o uso de computadores pessoais em casa. O lançamento do nosso Luxo Jr. … reforçou essa mudança de opinião dentro da comunidade profissional”.

É verdade que, como muitas outras tecnologias, o uso do computador revolucionou a indústria e a maneira como as animações eram produzidas, mas, guardadas as devidas proporções, a IA não deixa de ser apenas uma nova ferramenta. O ChatGPT e sua nova funcionalidade de criar ilustrações que reproduzem o estilo de estúdios famosos, como o do Studio Ghibli, não transformaram ninguém em um ilustrador profissional. Você não vai conseguir concorrer com quem dedica anos de estudo e prática à ilustração, porque existe muito mais conhecimento e experiência ali do que o simples domínio de uma ferramenta.

É exatamente por isso que temos uma divisão no mercado sobre a adoção das tecnologias de IA. Em geral, estúdios focados no desenvolvimento de séries de animação tendem a valorizar mais o lado artístico e a criatividade, fazendo pouco uso da IA e priorizando a produção criada por artistas. Já estúdios focados em animações para a indústria publicitária procuram utilizar mais essas ferramentas para agilizar o trabalho, por entender esse material como uma forma de vender um produto ou serviço e não como uma obra de arte.

No meio acadêmico, essas divergências vão aos poucos aparecendo. Muitos professores e pesquisadores tentam se fechar para o uso das ferramentas de IA, fazendo questionamentos válidos sobre ética, plágio e os impactos da nova tecnologia no desenvolvimento dos alunos. A academia não pode simplesmente lutar contra a sua adoção. A IA chegou com tudo e para ficar, tanto como ferramenta de trabalho, quanto como parte do nosso cotidiano, como a trend do Studio Ghibli demonstrou.

As questões éticas devem sim ser discutidas, porém não podemos aguardar a criação e a evolução das leis para pensarmos na utilização da tecnologia, porque boa parte do mercado já está adotando e cobrando a fluência nessas ferramentas. O foco deveria ser na construção de uma abordagem pedagógica que trabalhe capacitação técnica e reflexiva, levantando questões sobre a relação entre o trabalho criativo e suas ferramentas. Um desses caminhos pode ser pensar no reposicionamento da IA, não como substituta da criatividade humana, mas como aliada estratégica no processo criativo. Formações que combinam competências técnicas com pensamento filosófico, ético e político serão as mais preparadas para lidar com o novo cenário.

A integração da IA à produção artística representa um novo capítulo na história da relação entre criação e tecnologia. Não se trata de escolher entre aceitá-la ou rejeitá-la. Se a IA é uma ferramenta, o que precisamos são profissionais que saibam decidir quando usá-la e quando não utilizá-la. A arte sempre incorporou a tecnologia, do carvão ao computador. A questão não é a chegada da IA, mas o que faremos com ela.

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