Parem as máquinas?
Como a comodidade e velocidade da IA desafiam a credibilidade de marcas e veículos
Uma recente reportagem publicada na Revista Piauí sobre inteligência artificial no jornalismo trouxe à tona um alerta urgente: a velocidade da produção não pode superar a consistência e a veracidade da informação.
E se até veículos consolidados, como a Exame, se veem reféns de erros gerados por IA, como a famosa lista de “vilãs de novela” recheada de personagens que jamais existiram: o que podemos esperar do universo corporativo, que hoje produz conteúdo em escala e se comunica com múltiplos públicos?
O que a reportagem da Piauí evidencia é que a IA, apesar de promissora, ainda pode gerar informações imprecisas ou fictícias, fenômeno conhecido como “alucinação” da inteligência artificial.
O episódio envolvendo a Exame ilustra como até processos editoriais estruturados precisam ser acompanhados de curadoria e verificação humana quando se utiliza tecnologia generativa.
E os números confirmam que esse fenômeno não é isolado. Uma pesquisa global do projeto JournalismAI, que ouviu jornalistas de 105 redações em 46 países, indicou que 90% já haviam utilizado IA em alguma etapa da produção e 75% recorreram a ela durante a apuração.
No Brasil, um estudo da ESPM em parceria com Jornalistas&Cia revelou que mais da metade dos profissionais (56%) já aplicam IA em etapas de redação, apuração ou distribuição de conteúdo, e 68% deles expressam preocupação com a possibilidade de demissões em função da popularização dessas ferramentas.
Esses dados deixam claro que a tecnologia não é futurista: ela já está moldando processos e redefinindo o mercado, reforçando a necessidade de supervisão humana e critérios éticos para preservar a credibilidade, tanto de veículos de imprensa quanto de marcas corporativas.
A inteligência artificial promete eficiência: produzir relatórios, textos, posts e até campanhas em minutos. Para veículos de comunicação e empresas, a sedução é natural: maior volume de conteúdo, menor custo e rapidez na entrega. Mas há um preço invisível e potencialmente irreversível: a perda de confiança do público.
Jornalismo e comunicação: a mesma lição
A lição do jornalismo é direta para a comunicação corporativa. Não basta gerar conteúdo em alta velocidade; é preciso garantir precisão, relevância e transparência.
A IA deve ser vista como uma aliada, uma ferramenta que potencializa a produtividade, mas nunca como substituta da revisão crítica, do olhar humano e da responsabilidade editorial. Marcas que confundirem quantidade com qualidade estão fadadas a enfrentar a mesma perda de credibilidade que assusta o jornalismo hoje.
Os aprendizados do caso são claros e se estendem tanto ao jornalismo quanto à comunicação corporativa. A curadoria humana continua sendo essencial: a tecnologia não substitui a revisão, a apuração e o bom senso, e sua utilização exige critérios rigorosos para preservar a qualidade do conteúdo.
A transparência também se mostra um elemento estratégico: informar ao público quando houve uso de inteligência artificial no processo de produção não é apenas uma questão ética, mas uma forma de fortalecer a confiança e a credibilidade.
Por fim, a experiência evidencia que credibilidade é um ativo frágil. Em um cenário de excesso de informação e competição por atenção, um erro, mesmo que involuntário, pode custar caro, afetando a reputação, a audiência e, para marcas, o valor de mercado.
A discussão sobre IA e comunicação não é futurista; ela acontece agora e exige reflexão estratégica constante.
O grande desafio para veículos de imprensa e para marcas não é apenas adotar a tecnologia, mas encontrar o equilíbrio adequado entre velocidade, escala e confiança. Porque, no fim das contas, a reputação continua sendo o bem mais valioso que temos, e, até onde sabemos, ela ainda não pode ser automatizada.