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Opinião

Quem patrocina quem?

No futuro fluido, empresas de comunicação, de videogame, marcas e detentores de direitos serão, algumas vezes, patrocinadores e, outras, patrocinados


18 de janeiro de 2021 - 13h55

Graças ao seriado O Gambito da Rainha, da Netflix, milhões de pessoas, especialmente mulheres, decidiram começar a jogar xadrez (crédito: Reprodução/Netflix Brasil/YouTube)

Há décadas os patrocínios esportivos são variações de um mesmo tema. Uma empresa interessada em falar com torcedores de um determinado esporte pagando os detentores de direitos — um clube, uma liga ou atletas — por acesso, conteúdo e experiências.

Mas isso está prestes a mudar graças à democratização do acesso a conteúdo de qualidade e às novas tecnologias. Esses fatores vão mudar o nosso entendimento do que é um patrocinador, um patrocinado e porque algumas empresas deverão mudar suas estratégias de investimento se quiserem continuar a crescer. Nesse ecossistema do esporte e entretenimento, muitos papeis serão redefinidos. A relação entre marcas e empresas de conteúdo deverá mudar.

Em junho, no fim do seu ano fiscal, a Nike divulgou seus resultados financeiros ressaltando o impacto negativo da pandemia. A maioria das suas categorias de produto tiveram desempenhos significativamente inferiores comparados ao ano anterior. A única exceção foi a marca Jordan, cuja receita cresceu 15%, chegando a US $ 3,6 bilhões. Na conferência com os analistas, o CEO da Nike, John Donahoe, destacou a crucial importância do documentário The Last Dance, produzido pela ESPN e exibido pela Netflix no Brasil. Se a Nike acelera seu crescimento graças à ESPN, não seria correto que ela patrocinasse a produção de conteúdo da emissora? A relação entre detentores de direitos e empresas de conteúdo deverá mudar.

Graças ao seriado O Gambito da Rainha, da Netflix, milhões de pessoas, especialmente mulheres, decidiram começar a jogar xadrez. Nas semanas seguintes ao lançamento da série, o site Chess.com adicionou mais de 2,4 milhões de jogadores enquanto a demanda por aulas virtuais na Premier Chess aumentou 50%. De acordo com a empresa de mídia esportiva Front Office Sports, a venda de jogos de xadrez aumentou 87% e a de livros sobre estratégias do jogo 603%. Se a prática de xadrez cresce graças à Netflix, não seria correto que a Federação Internacional de Xadrez patrocinasse a empresa? A relação entre detentores de direitos e empresas de videogames deverá mudar.

Grande parte dos jovens interessados em futebol aprendem sobre o esporte, clubes, jogadores e eventos através dos videogames. Graças à Electronic Arts e às centenas de milhões de cópias vendidas do seu jogo Fifa, adolescentes no Butão ou na Bolívia têm acesso, conhecimento e paixão iguais por times europeus ou pela seleção brasileira. Para os jovens da geração Z, o jogo Fifa se tornou a porta de entrada para o consumo do futebol. Para times, federações ou jogadores interessados em se comunicar com esse público, uma ferramenta indispensável para recrutar novos consumidores e fãs. Se o consumo de futebol depende cada vez mais dos videogames, não seria correto que as federações e clubes patrocinassem o jogo? A relação entre detentores de direitos e marcas deverá mudar

Se grandes empresas de bens de consumo, como a AB-Inbev, Unilever ou a P&G, decidissem promover uma de suas parcerias de esporte ou entretenimento através das suas embalagens, o alcance seria maior do que a maioria das empresas de comunicação no mundo pode oferecer. Todos os dias, suas marcas são consumidas bilhões de vezes, com produtos sendo distribuídos em lugares que empresas de mídia e plataformas digitais nem sonham em chegar. Para os detentores de direitos que precisam aumentar a lembrança e interesse pelos seus eventos, não há parceria melhor. Se a AB-Inbev, Unilever e a P&G são responsáveis pelo acesso a uma grande parcela dos potenciais torcedores, não seria correto que as federações e clubes as patrocinassem?

Neste futuro fluido, empresas de comunicação, de videogame, marcas e detentores de direitos serão, algumas vezes, patrocinadores e, outras, patrocinados. Os papeis podem se inverter dependendo da necessidade, mas a lógica continuará a mesma: quem precisa de ajuda, paga a conta.

*Crédito da foto no topo: Cassi Josh/ Unsplash

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