Quem patrocina quem?
No futuro fluido, empresas de comunicação, de videogame, marcas e detentores de direitos serão, algumas vezes, patrocinadores e, outras, patrocinados
No futuro fluido, empresas de comunicação, de videogame, marcas e detentores de direitos serão, algumas vezes, patrocinadores e, outras, patrocinados
Há décadas os patrocínios esportivos são variações de um mesmo tema. Uma empresa interessada em falar com torcedores de um determinado esporte pagando os detentores de direitos — um clube, uma liga ou atletas — por acesso, conteúdo e experiências.
Mas isso está prestes a mudar graças à democratização do acesso a conteúdo de qualidade e às novas tecnologias. Esses fatores vão mudar o nosso entendimento do que é um patrocinador, um patrocinado e porque algumas empresas deverão mudar suas estratégias de investimento se quiserem continuar a crescer. Nesse ecossistema do esporte e entretenimento, muitos papeis serão redefinidos. A relação entre marcas e empresas de conteúdo deverá mudar.
Em junho, no fim do seu ano fiscal, a Nike divulgou seus resultados financeiros ressaltando o impacto negativo da pandemia. A maioria das suas categorias de produto tiveram desempenhos significativamente inferiores comparados ao ano anterior. A única exceção foi a marca Jordan, cuja receita cresceu 15%, chegando a US $ 3,6 bilhões. Na conferência com os analistas, o CEO da Nike, John Donahoe, destacou a crucial importância do documentário The Last Dance, produzido pela ESPN e exibido pela Netflix no Brasil. Se a Nike acelera seu crescimento graças à ESPN, não seria correto que ela patrocinasse a produção de conteúdo da emissora? A relação entre detentores de direitos e empresas de conteúdo deverá mudar.
Graças ao seriado O Gambito da Rainha, da Netflix, milhões de pessoas, especialmente mulheres, decidiram começar a jogar xadrez. Nas semanas seguintes ao lançamento da série, o site Chess.com adicionou mais de 2,4 milhões de jogadores enquanto a demanda por aulas virtuais na Premier Chess aumentou 50%. De acordo com a empresa de mídia esportiva Front Office Sports, a venda de jogos de xadrez aumentou 87% e a de livros sobre estratégias do jogo 603%. Se a prática de xadrez cresce graças à Netflix, não seria correto que a Federação Internacional de Xadrez patrocinasse a empresa? A relação entre detentores de direitos e empresas de videogames deverá mudar.
Grande parte dos jovens interessados em futebol aprendem sobre o esporte, clubes, jogadores e eventos através dos videogames. Graças à Electronic Arts e às centenas de milhões de cópias vendidas do seu jogo Fifa, adolescentes no Butão ou na Bolívia têm acesso, conhecimento e paixão iguais por times europeus ou pela seleção brasileira. Para os jovens da geração Z, o jogo Fifa se tornou a porta de entrada para o consumo do futebol. Para times, federações ou jogadores interessados em se comunicar com esse público, uma ferramenta indispensável para recrutar novos consumidores e fãs. Se o consumo de futebol depende cada vez mais dos videogames, não seria correto que as federações e clubes patrocinassem o jogo? A relação entre detentores de direitos e marcas deverá mudar
Se grandes empresas de bens de consumo, como a AB-Inbev, Unilever ou a P&G, decidissem promover uma de suas parcerias de esporte ou entretenimento através das suas embalagens, o alcance seria maior do que a maioria das empresas de comunicação no mundo pode oferecer. Todos os dias, suas marcas são consumidas bilhões de vezes, com produtos sendo distribuídos em lugares que empresas de mídia e plataformas digitais nem sonham em chegar. Para os detentores de direitos que precisam aumentar a lembrança e interesse pelos seus eventos, não há parceria melhor. Se a AB-Inbev, Unilever e a P&G são responsáveis pelo acesso a uma grande parcela dos potenciais torcedores, não seria correto que as federações e clubes as patrocinassem?
Neste futuro fluido, empresas de comunicação, de videogame, marcas e detentores de direitos serão, algumas vezes, patrocinadores e, outras, patrocinados. Os papeis podem se inverter dependendo da necessidade, mas a lógica continuará a mesma: quem precisa de ajuda, paga a conta.
*Crédito da foto no topo: Cassi Josh/ Unsplash
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