O que aprendi sendo dono de uma agência
Foi o curso mais longo e caro da minha vida, em que, no final, não teve diploma, mas cicatrizes e aprendizados importantes
Foram 15 anos liderando uma agência independente que eu fundei sem dinheiro ou experiência. Quinze anos de apostas, ganhos, perdas e reuniões demais. Este ano, decidi sair e buscar novos desafios. Esse tempo todo foi o curso mais longo e mais caro da minha vida. E, claro, não teve diploma, somente cicatrizes. Mas serviu. Aprendi algumas coisas. Cinco, para ser mais exato.
1. Não seja febrão
Ou, em outras palavras, não se renda à impulsividade que habita o espaço entre a falta e o desejo. O febrão é aquele que corre antes de saber para onde vai. O criativo que quer salvar o mundo antes de entender o briefing. O moleque que mal aprendeu a usar o Photoshop e já quer ser diretor de criação. A agência que vive em combustão, achando que urgência é sinônimo de importância. Todo mundo já foi febrão um dia. Eu também. A gente se confunde: acha que resolver rápido é o mesmo que resolver bem. Mas a verdade é que a febre não cura nada — só mostra que algo está errado por dentro.
2. É sempre bom ter cópias
Nada nem ninguém é insubstituível. As coisas travam, as pessoas somem, os clientes abrem concorrências, os contextos viram poeira. Ter cópias é somente admitir que o mundo é instável e a gente também. É inteligência, não paranoia. Não é medo da perda, mas consciência da impermanência. Documentar o que se aprendeu, compartilhar, ensinar. Não guarde tudo para si — o talento não é troféu, é critério. Liderar é espalhar consciência, distribuir autoria, criar redundância saudável e entender que o verdadeiro poder está em se reconhecer dispensável. Ter cópias não é fazer backup: é garantir que a roda continue girando quando você decidir sair para fumar um cigarro e não voltar mais.
3. Declare guerra santa à mediocridade
Um dia, o velho Faveco (Flávio Antonio Corrêa) me disse isso, entre uma tragada e outra, com a calma de quem já viu o inferno do trabalho de perto: “Guerra santa à mediocridade.” Por muito tempo, tentei ser o bonzinho. Acreditei que paciência e carinho iam consertar caráter. Que todo mundo, com o tempo, melhora. A bondade mal aplicada é o jeito mais confortável de ser cúmplice do fracasso. Gente medíocre não melhora. Ela suga. Confunde liberdade com bagunça, sinceridade com grosseria, autenticidade com desídia. E o pior: custa caro — não apenas em dinheiro, mas em energia e respeito. Manter esse tipo de gente por medo de conflito é uma covardia com perfume de ética.
4. A agência é uma escola — mas sem recreio
A agência educa o tempo todo, mesmo quando finge que não. Por dentro, ensina as pessoas a lidar com pressão, com o erro, com a diferença. E, principalmente, com o tempo — esse inimigo íntimo. Por fora, educa marcas e clientes sobre como ouvir, como contar histórias e como não serem babacas. Fala de responsabilidade, diversidade, sustentabilidade. Às vezes, eles escutam. Às vezes, não. Mas é isso: cada job é uma chance de fazer o mundo um pouco menos idiota.
5. O recrutamento é um espelho
O processo de recrutamento mostra quem a agência é de verdade. Quando é frio, confuso e sem resposta, mostra que lá dentro também é assim: descaso, ego e silêncio. Mas quando é humano, transparente, cheio de diálogo, mostra que alguém entendeu o que significa respeito. Tive sorte de ver isso acontecer de verdade. Uma profissional de RH que fazia o processo com alma. Falava com todo mundo, dava retorno, tratava cada pessoa como quem se importa. E, olha, isso muda tudo. Porque no fim, não é sobre contratar alguém. É sobre dizer: “Aqui, a gente ainda acredita em gente.”