Black Influence: diversidade em prol do consumo
CEO da agência, Ricardo Silvestre destaca a importãncia de manter a representatividade na agenda das marcas

Ricardo Silvestre, fundador e CEO da Black Influence (Créditos: Jordan Vilas)
Com a premissa de conectar marcas e campanhas a criadores de conteúdo de comunidades diversas, a Black Influence completa seis anos no mercado nacional.
Fundada por Ricardo Silvestre, a agência nasceu com o objetivo de transformar representatividade em estratégia de negócio ao desenvolver campanhas que não apenas abraçam a causa racial, mas despertam mudanças reais de narrativa e geram oportunidades duradouras para criadores de conteúdo negros.
O grande objetivo, segundo Silvestre, está não só em ampliar a visibilidade desses criadores, mas também em entregar autenticidade nas narrativas transmitidas.
“Vemos várias agências que falam sobre a pauta, mas não vivem isso no dia a dia. Nós temos essa preocupação, tudo que desenvolvemos é porque, de fato, vivemos. Trazemos representatividade de um jeito natural e honesto, sem forçar a barra”, diz o CEO.
O faturamento acumulado da agência nos últimos seis anos é de aproximadamente R$ 20 milhões. Considerando também a receita gerada em parceria com os criadores de conteúdo, o valor salta para os R$ 60 milhões. Entre os pilares da operação, segundo Silvestre, está o compromisso de oferecer aos criadores oportunidades de alcançar independência financeira, favorecendo seu desenvolvimento e a capacidade de investir em seus próprios negócios.
“Isso é um marco histórico, principalmente porque são criadores pretos, muitas vezes fora do eixo Rio-São Paulo, que não eram considerados em campanhas. A partir do nascimento da Black Influence, eles passaram a ser vistos por um mercado que, na maior parte do tempo, não consome conteúdo de pessoas pretas”, conta.
Neste ano, a Black Influence desenvolveu, junto ao Grupo L’Oréal, um programa de enfrentamento ao racismo no mercado de beleza de luxo brasileiro. Intitulado “Afroluxo”, o projeto traz à tona dados que escancaram a discriminação racial vivida por pessoas no segmento, tem como objetivo central promover a inclusão e o acolhimento de pessoas negras em lojas, além de enfrentar as barreiras raciais ainda predominantes no atendimento.
A Black Influence atuou como consultoria para o Grupo L’Oréal, garantindo que as campanhas do Grupo abordassem questões de representatividade de maneira adequada. Segundo Silvestre, a parceria, que iniciou em 2023, segue em expansão com foco em construir cada vez mais campanhas honestas e representativas no segmento de beleza.
Outro destaque foi o lançamento da linha Natura Tododia Jambo Rosa e Flor de Caju, desenvolvida para peles negras e pardas. A Black Influence atuou no apoio ao plano de lançamento da linha, que faz parte do Compromisso Antirracista da Natura, iniciado em 2022.
Retração em pautas de DE&I no mercado publicitário
A agência completa seis anos em um período em que pautas de diversidade, equidade e inclusão (DE&I) sofrem intensa retração em escala global, com uma cultura anti woke ganhando cada vez mais força e espaço.
Desde a vitória de Donald Trump nas eleições americanas para presidente de 2024, uma série de decretos contra a diversidade e inclusão foram anunciados. Nesta segunda-feira, 15, o Washington Post divulgou que a administração de Trump ordenou a remoção de materiais relacionados à escravidão de múltiplos parques nacionais, o que vai ao encontro da ordem executiva assinada em março, que ordena ao Departamento do Interior a remoção de informações com “ideologias corrosivas”, que menosprezem os americanos.
Tal movimentação observada na política tem refletido diretamente na publicidade, com a retração de políticas de inclusão nas empresas e campanhas polêmicas, como a recente “Sydney Sweeney tem ótimos jeans” da American Eagle, que exaltou o estereótipo da mulher branca como a personificação dos “genes perfeitos”.
Apesar de menos intensa, a onda anti-woke também tem ganhado força no Brasil. Recentemente, a Vale demitiu a vice-presidente de RH Catia Porto, que alertou para a perda de espaço da cultura inclusiva nas empresas brasileiras.
Apesar do cenário desafiador que se constrói globalmente, Silvestre se mantém otimista quanto ao protagonismo do Brasil em pautas de diversidade, e acredita ser possível superar as resistências aos debates sobre inclusão e equidade.
“Não tem como a gente varrer para debaixo do tapete todas as nossas construções enquanto um país absolutamente diverso. Somos 200 milhões de brasileiros, somos o país mais negro fora da África, não tem como a gente tirar as mulheres, pessoas LGBT e pessoas negras das campanhas, porque se não não tem campanha, não tem consumo”, explica o CEO.
Segundo dados do IBGE de 2024, a população negra é responsável por movimentar R$ 1,46 trilhão na economia nacional, o que representa mais dinheiro que os dados de consumo de toda a classe A brasileira.
“Uma marca sem o consumo da população negra deixa de existir. Por isso acredito que essa onda não vai durar para sempre e, sem dúvida, as marcas que acreditam nela terão grandes prejuízos, porque elas vão ter que correr atrás do público que parou de consumir seus produtos. No fim, não é um bom negócio”, acrescenta Silvestre.
Empresas que reconhecem a importância de dialogar com a diversidade que compõe o público brasileiro e conseguem gerar identificação tendem a se fortalecer e se destacar no mercado. Silvestre ressalta que não se trata apenas de uma pauta identitária, mas também de uma questão estratégica de negócios.
“Quando nós [da Black Influence] colocamos uma campanha na rua, avaliamos o sentimento do consumidor que é impactado, e o resultado é sempre muito positivo, porque existe uma conexão real com as pessoas. Elas se sentem pertencentes àquilo, se sentem vistas, e logo tendem a consumir mais”, diz.
Silvestre ainda destaca que a pauta racial vive, historicamente, altos e baixos no que tange à relevância perante o público. Grandes acontecimentos, como o assassinato do americano George Floyd, que desencadeou o movimento Black Lives Matter, representam pontos de virada na história para que pautas de DE&I sejam observadas com sua devida importância. Segundo Silvestre, apesar de o evento representar algo extremamente negativo, trouxe resultados positivos para a visibilidade do tema no Brasil, permitindo que a história ganhasse repercussão e permanecesse em debate.
“Agora com essa agenda anti-woke, começamos a contar essa história de novo. Vamos acendendo alertas, entendendo como vamos nos reinventar, como vamos trazer outro olhar para essa pauta. Esse é o desafio, se manter nesse lugar de relevância”, aponta Silvestre.
Regulamentação das redes sociais e o impacto no setor de influência
Conversas sobre a regulamentação das redes sociais têm ganhado espaço na mídia brasileira, impulsionadas por episódios como a CPI das Bets, que colocou em pauta a responsabilidade dos influenciadores na promoção de apostas ilegais e práticas de propaganda enganosa
Outro fator que contribuiu para a efervescência do tema foi a entrada da Meta no Conselho de Autorregulamentação Publicitária (Conar), ampliando debates sobre a linha que divide liberdade de expressão e ética nas redes sociais.
Silvestre acrescenta que a iminente regulamentação das redes sociais não representa um entrave para o ramo creator, mas sim uma oportunidade de tornar a criação de conteúdo mais responsável e ética.
A Black Influence já rejeitou campanhas que não estavam de acordo com os valores da agência. A princípio, tal decisão pode ser encarada como um fator limitador, mas Silvestre ressalta que se trata de um princípio inegociável — e que, mais do que restringir, posiciona a agência como um diferencial estratégico no mercado.
“O criador de conteúdo tem o poder de influenciar outras pessoas a fazerem o que é certo ou não, e questões regulatórias surgem muito com esse intuito de garantir que tudo aconteça de um jeito saudável. De fato, é um lugar muito importante por onde precisamos caminhar”, acrescenta CEO.
Para os próximos anos, a Black Influence mira expandir sua atuação internacionalmente, tanto ajudando marcas internacionais a encontrarem espaço no mercado brasileiro, quanto levando representatividade negra mundo afora.