VAR no jurado-herói
Existe uma expectativa sobre a experiência do juri que me dá preguiça
Existe uma expectativa sobre a experiência do juri que me dá preguiça
13 de junho de 2019 - 19h32
Brasileiro adora brinde. Brasileiro adora mais ainda se for customizado. O kit de recepção de um jurado é uma caixa com o seu crachá todo pomposo na frente, um pendura-crachá dentro, programação e um moleskine dourado com o nome impresso. Tudo o que a minha mãe contaria para as amigas, mandaria foto para comprovar junto com um gif de uma mão abençoando um arco-íris. Foi o meu momento Bozó do crachá da Globo. Alô mãe, tô no balneário.
Para equilibrar, uma história sobre o meu pai. Primeira vez na Riviera Francesa. Meu pai tinha falecido naquele início de ano. Nessa época, você não sabia o que esperar quando adentrava o Palais. Encontro um lugar no auditório e começa a passar o comercial da New Zealand Telecom com a música “Father & Son”. Poderia ser hoje, a emoção seria a mesma. Deixo o comercial guardado de molho no Youtube. É a minha lembrança estilo “This is Us”.
Esses textos serão de cortes abruptos. Agora mesmo, vou começar a falar a da missão do jurado brasileiro em Cannes. É engraçado. A pessoa pergunta: e aí? Tá nervoso? Eu respondo: não, tô tranquilo. E isso dá uma quebra de expectativa. O jurado brasileiro não é um jurado qualquer. Ele é um homem com uma missão. Ele tem que agradar a sua equipe, as agências parceiras de grupo, as não parceiras, a imprensa, o País. Parou, parou, parou. Vamos puxar o VAR.
O jurado não vai para uma guerra. Ele vai para um festival. Tem open bar, brindes e almoço grátis. Não é exatamente uma missão de vida ou morte. Ele tem que julgar o que de melhor foi feito na categoria. É muito trabalho? É, mas há de se ter a noção que pior mesmo é estar trancafiado em um job de concorrência com 12 agências com a chance de derrota viva na memória. Muita calma nessa hora. Eu estou aqui para julgar peças, não para resgatar um soldado ferido.
Não tenho muita inclinação para viver a figura do jurado-herói. O cara que sai do julgamento com uma história épica do que ele fez para salvar aquela peça. “Ah, porque a ideia estava lá combalida tomando tiros de todos os lados. Até que eu me joguei em cima da campanha e deixei meu corpo ser alvejado por foguetes de todos os cantos do mundo. Mas eu sou brasileiro, enfrento as adversidades e, por isso, levantei com o sangue ainda quente, as lágrimas escorrendo e carreguei a peça no colo. Ela que seria um reles short-list, agora está condecorada”. Preguiça.
Hoje, teve julgamento. Não foi Resgate do Soldado Ryan. Cada jurado no seu canto com um scanner clicando nas peças. O som do “bip” domina a sala. A discussão ainda está longe de começar. É tudo ameno. A cidade está vazia, os preços parecem até menores, tem campeonato de vôlei no final de semana. Nessa calmaria toda, percebi que tem muito sósia do Picasso na Riviera Francesa (reparem) e que o Erick Rosa está com as pernas da mesma cor que o sobrenome. Carioca que vai para Tóquio e esquece regras básicas, o sol pune. Usem filtro solar.
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