Tor Myhren: “A IA não vai matar a publicidade, mas também não vai salvar”
Com análise realista da tecnologia, o vice-presidente de marketing da Apple, homenageada como Anunciante do Ano, exaltou o poder da criatividade humana sobre os algoritmos
Tor Myhren: “A IA não vai matar a publicidade, mas também não vai salvar”
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Roseani Rocha
16 de junho de 2025 - 8h02
Tor Myhren, vice-presidente de marketing e comunicação da Apple, abriu a programação de seminários do Cannes Lions 2025, num auditório Lumière lotado. Além de – também como esperado – exibir o suprassumo das campanhas recentes que levaram a marca a ser homenageada como Anunciante do Ano, seu painel como um todo foi uma mensagem de otimismo ao mercado publicitário e, mais especificamente, aos criativos.
Simon Cook, CEO do Cannes Lions, introduziu o palestrante ressaltando que a homenagem é feita desde 1992 e a Apple a recebe pela segunda vez (a primeira foi em 2019) por ser “uma marca que nos encoraja a pensar criatividade e pensar diferente”, além de fazer isso com uma execução sofisticada, muitas vezes bem-humorada e ousada.
Myhren, que nomeou sua apresentação como “Human after all” (“Humano, afinal”) destacou que está no ramo já há algum tempo, adora processos, resolver problemas e o craft, mas a criatividade está mudando rapidamente, com as máquinas fazendo mais pelos profissionais e os algoritmos tomando decisões lógicas. A questão, disse, é que lógica não é sempre o caminho para a conexão humana. “You gotta feel it” (Você precisa sentir) foi a primeira das mensagens que destacou ao longo de seus 30 minutos de apresentação.
“Para alguém se apaixonar por sua marca, não é suficiente que o marketing apenas te faça entender alguma coisa. O marketing precisa fazer você sentir alguma coisa. E as pessoas são muito melhores nisso do que uma máquina”, afirmou. E exemplificou seu ponto lembrando que para um algoritmo, uma lágrima é água e sal, mas para uma pessoa pode ser um coração partido, um momento de luto.
O executivo da Apple disse não acreditar em previsões segundo as quais 99% da indústria irá sumir, dado o impacto da inteligência artificial (IA). Não deixou, entretanto, de reconhecê-la como uma tecnologia revolucionária que já está causando disrupção em toda a indústria, mas disse acreditar que será “um braço biônico”. Nestes tempos de muito medo, disse, Myhren, a boa notícia é que a IA não vai matar a publicidade, mas a ruim é que também não vai salvar.
Ao longo de sua apresentação, o vice-presidente da Apple destacou que a companhia sempre construiu valor por meio dos seus produtos, prezando pela acessibilidade, no sentido de fazer com que qualquer pessoa possa usá-los de modo intuitivo.
Exaltou uma nova funcionalidade dos airpods da marca – “hearing aid” – citando o próprio pai, de 88 anos, que foi visitá-lo na Califórnia e esqueceu seu aparelho auditivo. Ao testar os fones da Apple, acabou ficando com o produto, porque, segundo ele, funcionava quase tão bem quanto o aparelho auditivo que tinha custado US$ 5 mil “e ainda é mais bonito”.
“Os algoritmos não diriam que um comercial que começaria com 40 segundos de sons abafados seria uma boa ideia”, comentou Myhren sobre a campanha que divulgava os aparelhos e foi protagonizada por um pai que realmente tem problemas auditivos e teve a vida melhorada, quando passou a poder ouvir muito melhor sua filha.
Depois que o produto foi lançado, as buscas no Google pelo assunto “auxílio auditivo” tiveram um salto.
Outros pontos destacados pelo vice-presidente de marketing da Apple foram as campanhas em torno de privacidade, “um direito humano”, segundo o executivo – sendo o outdoor divulgado na CES, há alguns anos, a que teve maior repercussão, com a mensagem “What happens on your iphone stays on your iphone”, que brincava com a frase famosa sobre Las Vegas, cidade que abriga a conferência de eletrônicos (O que acontece em Vegas fica em Vegas). Mais recentemente, as ações envolveram o Safari, numa superprodução que mostra pessoas sendo perseguidas por câmeras.
Já para apresentar a tecnologia do Apple Vision Pro, em vez de uma campanha tradicional, a opção foi fazer um filme – Submerged – utilizando o recurso. As críticas da imprensa e outros veículos foram de que a tecnologia “mudará o futuro da produção cinematográfica”. Chamar atenção, aliás, é algo que a marca consegue fazer continuamente, como quando instalou uma simulação da sede da empresa fictícia Lumon Industries, da série Severance, no meio da Estação Central de Nova York. Com isso, ganhou uma quantidade imensa de mídia espontânea, além de amplo engajamento nas redes sociais.
“Keep it real” foi outra das mensagens de Myhren na manhã da segunda-feira em Cannes. Com isso, emendou o case “Shot on iPhone”, que começou há dez anos, com outdoors que exibiam fotos tiradas pelos usuários do smartphone. Depois, vieram os filmes e até videoclipes de personalidades como Selena Gomez e Lady Gaga.
Entre uma campanha e outra, Myhren ainda exaltou a relação da Apple com os desenvolvedores (embora seja sempre criticada por seus sistemas fechados) e o relacionamento de longo prazo com suas agências, especificamente 28 anos, no caso da TBWA/Media Arts Lab.
E sua mensagem final “Optmism” veio após a exibição do filme “Someday”, dirigido por Spike Jonze e estrelado pelo ator Pedro Pascal, para divulgar o AirPods 4. “O mundo precisa de otimismo e acredito na criatividade humana. O melhor marketing faz as pessoas rirem, se apaixonar. Não tem tecnologia ou IA que nos faça sentir mais que a mente humana. Esse é o jogo que podemos vencer”, disse o vice-presidente da Apple.
Com isso, defendeu que as pessoas assumam o comando da IA e resolvam problemas com pensamentos originais. Em vez de uma frase sua, deixou como mensagem final, uma proferida por Steve Jobs, um dos fundadores da Apple, há mais de 20 anos e que para Myhren continua muito atual: “Faça algo maravilhoso e divulgue. De certa forma, no ato de fazer alguma coisa com muito cuidado e amor, algo é transmitido. E é uma forma de expressar ao resto da nossa espécie nosso profundo apreço.”
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