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Cannes Lions

16 a 20 de junho de 2025 | Cannes França
Diário de Cannes

A propaganda está perdendo a graça?

Dados da Kantar mostram que o uso do humor na propaganda caiu 33% ao redor do mundo


20 de junho de 2025 - 15h49

Você, que assim como eu é apaixonado por propaganda criativa, pode ter ficado meio irritado com a pergunta no título da coluna. “Como assim tá perdendo a graça? Eu amo propaganda, continua com a mesma graça de sempre”.

Acho que eu mesmo fiquei irritado quando escrevi. Mas meu ponto aqui é sobre a redução do uso do humor na propaganda com o passar dos anos.

No painel “Laughing at Doom: Using Humor to Talk About Illness/Hellscapes”, Chris Charles (Executive Creative Director da 21GRAMS), junto com os humoristas Bill Nye (o Science Guy) e Fiona Cauley, trouxeram uma apresentação — na verdade, foi um show — ensinando como o humor pode ser usado para falar de assuntos difíceis.

Bill Nye contou que, hoje em dia, uma pessoa comum passa 51 minutos por dia consumindo notícia ruim. No universo da imprensa, tragédia vende.

Enquanto Chris falava sobre a potência do humor na propaganda, Bill trouxe mais dados. Assunto sério não precisa ser tratado de forma séria. Pelo menos, não sempre. Muito do humor está em rir da própria situação. E rir de coisas que fazem chorar é remédio: a risada reduz o estresse e faz bem à memória. O que faz rir desperta atenção e engaja. Rir cura.

Essa foi a deixa para a entrada da Fiona, com seu nome parodiando o logo da Hot Wheels projetado na tela. Em sua cadeira de rodas estilizada, ela nos fez rir sobre temas difíceis de sua vida pessoal. Contou como rir da própria situação a ajudava a lidar melhor com a vida, e deixou uma reflexão para os criativos:

“Eu já sei o quanto a minha situação é complicada, eu não preciso que a propaganda me lembre disso. Eu já chorei demais”, disse, com direito a um slide em letras garrafais.

Na conversa, Chris apresentou o primeiro Leão de Ouro da 21GRAMS para Biogen, com a campanha “Friedreich’s Back”, de 2025. Ela traz um personagem morto-vivo que sai de sua cova, descobre que seu nome virou nome de doença e se inscreve no programa de estágio da Biogen — responsável pelo primeiro tratamento efetivo para a condição.

Uma campanha ousada. O produto já era tão inovador que, em tese, uma abordagem direta seria suficiente. Mas isso seria a morte para quem ama criatividade.

Apesar de todos sabermos que rir faz bem, dados da Kantar mostram que, entre 2000 e 2020, o número de campanhas com humor caiu 33%.

Puxa vida. Se você parar para lembrar do que tem visto por aí, dá para perceber que isso é verdade. Em algum momento, o humor passou a ser visto como risco. Mas o maior risco na propaganda é não ser notado.

E olha que estou falando de uma perspectiva brasileira: o país criativo do ano em Cannes Lions, onde o humor está na raiz da nossa cultura.

Se olharmos para trás, o riso sempre foi marca registrada da propaganda nacional — desde Washington Olivetto, DPZ, Alex Periscinoto. E é muito legal ver o quanto os BR contribuem para deixar a publicidade mais engraçada. Este ano, no Cannes Lions, tivemos Leões para:

  • Pedigree Caramelo (AlmapBBDO);
  • Prize on the Bone (DM9);
  • Trash Talk Codes (Africa Creative);
  • Dirty Mouth Sponsorship (Droga5 SP);
  • Call of Discounts (GUT)

Campanhas que são impossíveis de assistir sem rir.

Esse dado da Kantar mostra que o riso virou uma tendência que faz chorar. Mas também revela uma oportunidade. Se hoje há menos campanha engraçada no ar, quem investir em humor pode pegar uma via com menos trânsito — e mais chance de ser percebido.

É tipo mercado financeiro: a ação caiu, você aproveita para comprar. Por isso, aqui vai uma dica valiosa: invista no humor. Você vai rir lá na frente.

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