As duas perguntas que Cannes pode responder
Cannes não é apenas uma vitrine de grandes campanhas, mas também de grandes questões da publicidade e do marketing
Cannes não é apenas uma vitrine de grandes campanhas, mas também de grandes questões da publicidade e do marketing
23 de junho de 2021 - 11h05
Cannes não é apenas uma vitrine de grandes campanhas, mas também de grandes questões da publicidade e do marketing. Uma dessas questões, que não é nova, é a perda de atratividade das agências para jovens talentos, já há algum tempo sendo seduzidos por outras posições na própria indústria ou mesmo em outros lugares – como as big techs, as startups e outras empresas mais desformatadas. Pra usar uma expressão do momento, agência se tornou cringe.
Do lugar de onde observo, de uma agência independente e digital cheia de jovens dessa nova geração, vejo duas perguntas que tem a ver com o papel das agências no mercado e no mundo e que um passeio pelos conteúdos de Cannes pode a ajudar a responder: qual é o trabalho criativo que as pessoas querem fazer e como elas querem fazer?
A primeira questão já está mais escancarada, como demonstram alguns dos trabalhos que começam a brilhar no festival. As ideias com impacto social, que já vinham tendo um protagonismo crescente em edições anteriores, agora são onipresentes e ganharam novas camadas. Entre os GPs, aparecem iniciativas que destravam obstáculos para os avanços desejados pela sociedade. “Contract for Change”, da FCB Chicago para a Michelob Ultra Pure Gold, por exemplo, criou um programa para viabilizar o aumento da oferta de orgânicos nos Estados Unidos. A marca se propõe a reduzir o prejuízo dos agricultores durante os três anos de transição para o novo processo, oferecendo a eles um contrato de longo prazo. Mais do que uma big idea, uma long idea.
Em “The Bread Exam”, da McCann Paris para a Spinneys and The Lebanese Breast Cancer Foundation, a campanha contornou os tabus locais sobre o corpo feminino usando uma influenciadora que ensinava a fazer o autoexame de mamas em vídeos que pareciam trazer apenas instruções sobre como fazer pão em casa. “Superb Owl”, da R/GA San Francisco para o Reddit usou um comercial de cinco segundos com zero custo de produção no SuperBowl para levar a audiência para o Google e se tornar o vídeo mais buscado desse icônico momento. Uma espécie de trolagem do Reddit e de sua comunidade à indústria do entretenimento. Já “Stevenage Challenge”, da David Madrid para o Burger King, a marca patrocinou um time da quarta divisão do futebol inglês que estava presente no FIFA 20 garantindo uma conexão emocional com o gigantesco público do jogo. E milhares de vídeos de gols nas redes sociais foram trocados por descontos.
Todas essas ideias, recheadas de causas sociais ou com o uso esperto da tecnologia, que se conectam naturalmente a comportamentos específicos e com valores contemporâneos ajudam a entender qual o trabalho criativo que a nova geração valoriza. Essa é uma resposta que podemos obter todos os anos em Cannes.
Já a segunda pergunta é um pouco mais difícil. Como chegar a trabalhos de grande impacto criativo sem passar pela velha estrada tortuosa de condições desumanas de trabalho e ameaças constantes à saúde mental? Essa é a questão que não aparece nos videcases. Mas ainda vou mergulhar na programação de palestras e debates para procurar alguma pista. Se eu encontrar, compartilho por aqui nos próximos textos.
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